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CONJUNTURA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL
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Segurança Hídrica

A Segurança Hídrica existe quando há disponibilidade de água em quantidade e qualidade suficientes para o atendimento às necessidades humanas, à prática das atividades econômicas e à conservação dos ecossistemas aquáticos, acompanhada de um nível aceitável de risco relacionado a secas e cheias.

Segurança Hídrica

A Segurança Hídrica existe quando há disponibilidade de água em quantidade e qualidade suficientes para o atendimento às necessidades humanas, à prática das atividades econômicas e à conservação dos ecossistemas aquáticos, acompanhada de um nível aceitável de risco relacionado a secas e cheias, de acordo com o conceito da Organização das Nações Unidas (ONU). O conceito considera quatro dimensões: econômica, humana, ecossistêmica e de resiliência, que devem ser balizadoras para a gestão da água, no sentido de garantir equidade ao acesso, preservação do recurso natural e a prevenção e mitigação de impactos oriundos de crises e desastres ambientais.

Essas dimensões são afetadas por fatores, tais como o aumento populacional, e consequente aumento das demandas de uso da água, a alterações no uso da terra, ocupação desordenada do solo e poluição hídrica, especialmente em áreas urbanas, mudanças climáticas e suas consequências no ciclo hidrológico, além da insuficiência de investimentos em infraestrutura hídrica, incluindo construção, manutenção e operação de reservatórios. Os efeitos sinérgicos entre esses fatores, associados a períodos mais críticos de escassez de chuvas, por exemplo, podem resultar em insegurança hídrica e na instalação de crises hídricas como as que vêm afetando o Brasil desde 2012.

Infográfico adaptado do Plano Nacional de Segurança Hídrica (PNSH) a partir de conceito da ONU (2013), disponível em: https://www.unwater.org/publications/water-security-infographic/

Balanço Hídrico

Independentemente da ocorrência de eventos extremos, o Balanço Hídrico se apresenta como uma ferramenta de gestão capaz de identificar pressões e potenciais conflitos que podem incidir sobre os recursos hídricos diante de diferentes cenários. É, portanto, um elemento fundamental para orientar a gestão e o planejamento nas bacias hidrográficas brasileiras, visando garantir a segurança hídrica.

O balanço hídrico quantitativo é um indicador do nível de comprometimento hídrico. Seu papel é identificar quanto da disponibilidade hídrica está sendo utilizada para atendimento de usos consuntivos. Isso é dado pela razão entre a demanda e a oferta e apresentado em termos de percentuais de comprometimento.

Nos balanços aqui apresentados, a demanda corresponde ao somatório das estimativas de vazão de retirada para os diversos usos consuntivos setoriais, associadas ao seu local de utilização e sem distinção entre usos superficiais e subterrâneos. Exceção se aplica ao abastecimento urbano, cuja vazão foi associada ao ponto de captação e apenas a parcela superficial foi contabilizada. A oferta, por sua vez, corresponde a uma vazão de alta garantia, definida como disponibilidade hídrica, e agrega a vazão Q95 e o acréscimo de garantia oferecido pelos reservatórios, de acordo com seu modo de operação.

Para fins do planejamento de curto e longo prazos, foram construídos 3 cenários de balanço hídrico: o atual, com demandas de 2020; o futuro, com demandas projetadas para 2040; e um cenário com mudanças climáticas. Para construção do cenário considerando efeitos de mudança no clima, foram estimados e avaliados os impactos, na demanda e na oferta, das previsões para o horizonte 2040 de 20 modelos climáticos globais do Coupled Model Intercomparison Project Phase 5 (CMIP5), para 2 cenários de emissão de gases de efeito estufa (RCP4.5 e RCP8.5) estabelecidos pelo Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (IPCC). Após análise, foi selecionado o modelo que implicou no maior aumento da demanda para irrigação e o que promoveu uma redução espacialmente abrangente na disponibilidade hídrica, priorizando, em ambos os casos, os modelos com boa representatividade do clima presente. Para os três cenários de balanço, os cálculos foram realizados para cada trecho de rio e classificados conforme percentual de comprometimento hídrico em: baixo (abaixo de 5%), mediano (5% a 30%), alto (30% a 70%), muito alto (70% a 100%), crítico (acima de 100%) e intermitente (oferta nula).

Eventos de Secas

Eventos extremos na distribuição das chuvas têm sido observados no País e podem ser indícios de mudanças climáticas e de alterações nos padrões da precipitação. A ocorrência desses eventos pode ser evidenciada pelo registro das declarações de Situação de Emergência (SE) ou Estado de Calamidade Pública (ECP), emitidas pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC) por solicitação de municípios em situações de crise devido aos impactos de eventos de secas ou cheias.

Para as estatísticas, foram considerados apenas eventos com reconhecimento federal inseridos no Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID). Os eventos podem ser classificados como “Registros”, “Reconhecidos” ou “Não Reconhecidos”. “Registros” são eventos onde não foi requerido o reconhecimento Federal de SE ou ECP. “Reconhecidos” tiveram o pedido de reconhecimento federal deferido pela SEDEC. “Não Reconhecidos” tiveram o pedido indeferido.

De 2017 a 2020, aproximadamente 89 milhões de pessoas foram afetadas por secas e estiagens no Brasil, cerca de 15 vezes mais que por cheias. Foram quantificados 7.570 eventos de seca associados a danos humanos, quase 10 vezes mais que os de cheias (730). Em 2020, mais de 10 milhões de pessoas foram afetadas por secas e estiagens no Brasil, sendo contabilizados 1.637 eventos neste ano.

O Monitor de Secas é um programa de acompanhamento regular e periódico da situação da seca no País, cujos resultados consolidados são divulgados por meio de mapas mensais nos quais se observa o surgimento, desaparecimento, evolução ou retração do fenômeno da seca nas UFs monitoradas. Atualmente, o instrumento monitora 20 UFs e pode ser utilizado pelas instituições para a tomada de decisão, de modo a fortalecer os mecanismos de monitoramento, previsão e alerta. De 2017 a 2020, destaca-se uma melhora progressiva na situação de seca em todos os 9 estados da região Nordeste, que saíram da condição de seca muito severa em 2017, marcada pelas categorias mais intensas da escala do Monitor, para uma condição expressivamente mais atenuada em 2020, quando se verificou seca fraca sobre aproximadamente 50% do Nordeste. Por outro lado, a partir da ampliação territorial do Monitor, verifica-se em 2020 maior intensidade do evento em UFs das outras regiões do País. 

Eventos de Cheias

Dos 5.570 municípios brasileiros, 2.753 (49,4%) decretaram Situação de Emergência (SE) ou Estado de Calamidade Pública (ECP) devido a cheias pelo menos uma vez de 2003 a 2020. Cerca de 88% (2.420) desses municípios localizam-se nas regiões Nordeste, Sul e Sudeste. Em 2020, mais de 800 mil pessoas foram afetadas por cheias (alagamentos, enxurradas e inundações) no Brasil. O dano humano mais perceptível em função das cheias é a perda da residência das pessoas afetadas. Danos mais graves (óbitos, desaparecimentos, enfermidades e ferimentos) afetaram 1% dessas pessoas.

Crises Hídricas

Desde 2012, situações de escassez hídrica, caracterizadas por reduzidos níveis de vazões e de armazenamento dos reservatórios, têm sido observadas em diferentes regiões. Pode-se observar um padrão espacial de expansão das situações no território brasileiro, principalmente de secas intensas e prolongadas, desde então. Nas crises hídricas, sejam as provocadas por secas ou cheias, impactos socioeconômicos e ambientais são gerados. Os usos múltiplos da água podem ser afetados, podendo haver prejuízos ao abastecimento público de água e à produção agropecuária, por exemplo. As crises são causadas por um conjunto de fatores que vão desde causas naturais, como a variabilidade sazonal e interanual nos padrões de chuvas, até causas antrópicas, como possíveis mudanças climáticas globais e aspectos políticos e socioeconômicos como o aumento populacional, o aumento da demanda hídrica e a insuficiência e/ou ineficiência de ações de gestão, sejam estruturantes e/ou não-estruturantes.

As crises hídricas que se estabeleceram em várias bacias hidrográficas do País desde 2012, a partir de cenários hidrológicos críticos, com índices pluviométricos e vazões dos rios abaixo da média histórica, afetaram os usos múltiplos da água e, em grande medida, o suprimento energético do País. A região Semiárida foi a primeira a sofrer com uma crise hídrica ocasionada pela mais longa e severa seca observada desde o início do século XX, quando os volumes de chuvas de 2012 a 2016 ficaram muito abaixo da média. Posteriormente, nos anos seguintes, diversas outras bacias e regiões enfrentaram secas intensas, que demandaram ações em prol da minimização de seus efeitos.

Os subsistemas Sudeste/Centro-Oeste são responsáveis por aproximadamente 70% da capacidade total de armazenamento para o fornecimento de energia ao SIN. Destacam-se os reservatórios das UGRHs do Paraná, Paranaíba, Grande e Paranapanema. Após períodos úmidos com poucas chuvas e reservatórios com níveis de armazenamento baixos no início da estação seca de 2021, houve o atingimento de somente cerca de 30% da capacidade desses subsistemas, prioritários ao suprimento energético do País. Diante desse cenário, em uma atuação coordenada para a gestão dos recursos energéticos e, sobretudo, da água, de maneira a atravessar a situação e manter o suprimento de água para os diversos setores usuários, de forma controlada, foi criada pela Medida Provisória nº 1055, de 28 de junho de 2021, a Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética (CREG). O objetivo foi ampliar a forma de enfrentamento da atual situação de escassez hídrica, a fim de garantir a continuidade e a segurança do suprimento eletroenergético. Desde setembro de 2020 o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) tem realizado reuniões mensais ordinárias e reuniões técnicas semanais envolvendo o Ministério das Minas e Energia (MME) e os principais órgãos que atuam no planejamento, operação, regulação e comercialização de energia, além de outras instituições, como a ANA e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).


As salas de situação da ANA e das UFs realizam o acompanhamento das condições hidrometeorológicas de bacias hidrográficas prioritárias e do armazenamento dos principais reservatórios do País. Utilizam dados de monitoramento de chuvas, de níveis e vazões de rios, de operação dos principais reservatórios, de previsões de tempo, de modelos hidrológicos e de registros de ocorrências de SE ou ECP. As informações geradas são compartilhadas por meio da divulgação de boletins e de sistemas de monitoramento. Já nas Salas de Crise, os atores envolvidos em situações de crise hídrica se articulam, em reuniões periódicas, para buscar soluções aos problemas críticos verificados em bacias ou regiões com reservatórios ou outras infraestruturas hídricas. O objetivo é promover medidas de aumento da segurança hídrica, da capacidade de resposta e da resiliência dos sistemas.

Marcos Regulatórios e Alocação Negociada

Para enfrentar a escassez de água, assegurando sua disponibilidade para todos os usos, termos de alocação negociada de água vêm sendo elaborados em diferentes reservatórios e sistemas hídricos. A alocação de água é um processo de gestão empregado para disciplinar os usos em sistemas hídricos impactados por estiagens intensas, com emergência ou forte potencial de conflito. São estabelecidas a partir de avaliações periódicas do estado hidrológico de cada reservatório ou sistema hídrico.

Além dos termos de alocação de água, em função de estiagens prolongadas e baixos níveis de reservatórios, pode-se estabelecer também em algumas bacias hidrográficas regras de restrição de uso da água com a finalidade de preservar e prolongar a disponibilidade hídrica, garantindo o atendimento aos usos prioritários da água (abastecimento humano e dessedentação animal). Para isso, podem ser publicadas resoluções dos órgãos gestores de recursos hídricos contendo flexibilização de condições de operação de reservatórios (em caráter temporário) e marcos regulatórios. Estes são orientações que objetivam regularizar e aplicar os instrumentos de gestão de recursos hídricos, a partir de um consenso entre os atores de interesse com o intuito de conciliar os diversos usos da água na bacia, e também se aplicam a sistemas hídricos específicos.

As alocações de água e os marcos regulatórios são ações eficazes que continuam a ser implementadas e resultam em aprendizagens relevantes que se aprimoram a cada ano no enfrentamento de situações de escassez hídrica. De 2017 a 2020 foram consolidados 146 termos de alocação de água pela ANA. Em 2020 foram publicadas 5 resoluções contendo flexibilização de condições de operação de reservatórios e sistemas hídricos, em caráter temporário. Entre 2017 e 2020 foram publicados 32 marcos regulatórios para sistemas hídricos críticos, dos quais 9 foram definidos em 2019 e se mantiveram em 2020.

Segurança Hídrica com foco na Infraestrutura Cinza

Diante da complexidade de fatores que envolvem a segurança hídrica e das fragilidades identificadas nas condições de suprimento de água à população e às atividades econômicas, a ANA e o MDR lançaram, em abril de 2019, o Plano Nacional de Segurança Hídrica (PNSH). O PNSH, baseado na avaliação dos fatores geradores de insegurança hídrica no País, definiu as principais intervenções estruturantes de natureza estratégica e relevância regional, necessárias para garantir a oferta de água para o abastecimento humano e para o uso em atividades produtivas, e melhorar a gestão dos riscos associados a eventos críticos (secas e cheias). O Índice de Segurança Hídrica (ISH), cuja metodologia foi desenvolvida com dados advindos de diversos estudos preexistentes da ANA e de órgãos afins, foi calculado no âmbito do PNSH e mensura os graus de segurança hídrica em todo o território nacional. O ISH incorpora em seu cálculo as diferentes dimensões da segurança hídrica e reflete o risco aos usos da água.

A partir dos resultados do ISH e da análise territorial, o PNSH apontou um conjunto de intervenções estratégicas para a minimização dos riscos associados à escassez de água e ao controle de cheias que somam cerca de R$ 26,9 bilhões. São 166 intervenções recomendadas (obras, projetos e estudos) no Programa de Segurança Hídrica (PSH). Destas, 99 estão plenamente habilitadas para execução até 2035, sendo que 95 destinam-se a ampliar a oferta de água (sistemas adutores, eixos/canais e barragens) e 4 correspondem a barragens para controle de cheias. As intervenções plenamente habilitadas no PNSH, destacadamente as que recebem apoio da União em sua realização, estão em fase adiantada de planejamento, requerendo apenas detalhamentos, em termos de projeto de engenharia ou finalização de obras em andamento. O apoio da União na implementação dessas intervenções representa um investimento de R$ 17,6 bilhões, dos quais R$ 13,2 bilhões já foram desembolsados, sendo R$ 1,5 bilhões em 2020.

No contexto em que barragens e demais obras hídricas de reservação de água e rejeitos são imperativas no contexto da segurança hídrica, a segurança de barragens desponta como tema prioritário. A segurança de barragens é normatizada pela Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), Lei nº 12.334/2010. Esta norma dispõe sobre a acumulação de água e de resíduos industriais e a disposição final ou temporária de rejeitos e estabelece a responsabilidade da ANA para coordenar o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB), dentre outras ações, como a elaboração periódica do Relatório de Segurança de Barragens (RSB), cuja 9ª edição foi lançada em 2020. A ANA possui competência para fiscalizar as barragens para as quais emite outorga, exceto as destinadas à geração hidrelétrica. Em 2020, constava no SNISB um total 21.953 barragens cadastradas para os mais diversos usos, sendo que 5.591 destas (25%) se submetem à PNSB, em função de características como altura, volume, material armazenado ou dano potencial associado.

As barragens podem ser classificadas por dano potencial associado (DPA), em função do potencial de perdas de vidas humanas e impactos econômicos, sociais e ambientais decorrentes de eventual ruptura, e pela categoria de risco (CRI), em função de características técnicas, estado de conservação do empreendimento e atendimento ao plano de segurança da barragem.

Em 2020 a ANA incorporou a seu cadastro 928 barragens de água, através de levantamento atualizado de massas d'água de domínio da União, passando a compreender 1.133 barragens sob sua competência. Destas, 196 já foram classificadas quanto ao DPA e à CRI, bem como são fiscalizadas regularmente quanto a segurança. Quanto à atuação das UFs, 17 delas já possuem planejamento anual das atividades de fiscalização de segurança de barragens e as demais têm sido apoiadas pela ANA para avançarem no tema.

O monitoramento das ações elencadas no PNSH é realizado pelo Núcleo de Segurança Hídrica (NSH), instituído pelo MDR por meio da Portaria nº 2.715 de 2019. Nos Boletins de Monitoramento do PNSH, publicados anualmente, é possível conhecer o andamento de cada intervenção planejada. Em uma perspectiva futura, vale ressaltar a elaboração de Projeto de Lei em curso pelo Governo Federal, denominado de Marco Hídrico, que propõe uma série de medidas para aumentar a segurança hídrica no Brasil.

Segurança Hídrica para o Abastecimento Urbano

Em outubro de 2021 foi lançado o Atlas Águas: Segurança Hídrica do Abastecimento Urbano, que atualiza o Atlas lançado em 2010, e incorpora conceitos e ferramentas do PNSH para trazer a caracterização e o diagnóstico atual dos mananciais e sistemas de abastecimento das sedes municipais brasileiras, identificando vulnerabilidades específicas para o setor. Para as análises foi utilizado o Índice de Segurança Hídrica Urbano (ISH-U), calculado a partir da eficiência da produção (combinação de indicadores de vulnerabilidade dos mananciais e de sistemas produtores de água) e da eficiência da distribuição (combinação de indicadores de cobertura de rede de distribuição de água e de infraestrutura para o gerenciamento de perdas).

O ISH-U demonstra que a maior parte da população urbana brasileira (68%) vive com segurança hídrica média ou baixa no abastecimento de água, devido a fragilidades na produção ou na distribuição de água (ou em ambas). O Atlas Águas indica soluções para o atendimento de toda a população urbana no País até 2035 e estima a necessidade de investimentos da ordem de R$ 110,3 bilhões para garantir a segurança hídrica das sedes urbanas, sendo 57% desse valor destinado à produção e 43% à distribuição de água.

A combinação do Atlas Águas com o PNSH pode trazer resultados sinérgicos ao avanço da gestão dos recursos hídricos no Brasil, além de subsidiarem diretrizes e ações para o novo Plano Nacional de Recursos Hídricos no horizonte de 2022 até 2040.

Segurança Hídrica com foco na Infraestrutura Verde

A infraestrutura verde, natural ou ecológica é a aplicação de uma Solução baseada na Natureza (SbN) para fornecer opções de administração dos recursos hídricos. As SbN são inspiradas e suportadas pela natureza e usam, ou imitam, processos naturais que são propositalmente manejados para se obter benefícios relacionados à gestão da água. Portanto, a infraestrutura é a aplicação prática de uma SbN, propositalmente implantada, projetada ou manejada, e com benefícios equivalentes ou similares à infraestrutura cinza (construída) para a água.

As SbN focam nos serviços ecossistêmicos que geram resultados positivos e desejados no manejo da água, principalmente a ciclagem e o armazenamento de matéria e energia entre diversos compartimentos do meio ambiente. Nas áreas de preservação permanente (APPs), protegidas com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, o solo, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora e assegurar o bem-estar das populações humanas, é prevista a preservação ou restauração da vegetação nativa, com o objetivo de garantir a oferta de serviços ecossistêmicos. Como forma de incentivo para a restauração, há mecanismos que buscam recompensar o produtor rural, denominados pagamentos por serviços ambientais (PSA).

Os serviços ecossistêmicos são pressupostos básicos dos conceitos de SbN e infraestrutura verde. Uma estratégia para auxiliar na conservação de recursos hídricos, com foco especial no abatimento de fontes difusas de poluição, está em ampliar técnicas e práticas de uso do solo e planejamento da cobertura do solo em escala de bacia hidrográfica. Na área rural, as intervenções visando à conservação da qualidade e quantidade de água são implantadas principalmente em APPs e contam cada vez mais com apoio de PSA.

No Brasil, o programa que utiliza há mais tempo o PSA é conduzido pela ANA, o Programa Produtor de Água (PPA), destinado a promover a conservação dos recursos hídricos no meio rural, visando segurança hídrica. A atuação da ANA se dá por meio do apoio aos projetos, onde são previstas uma série de ações de conservação de água e do solo, como a construção de terraços e bacias de infiltração (barraginhas), readequação de estradas vicinais, recuperação e proteção de nascentes e matas ciliares. Idealizado em 2001, o PPA já apoiou cerca de 60 projetos distribuídos por 15 UFs.

Ao longo dos anos, as ações de recuperação de rios ou bacias hidrográficas no Brasil foram realizadas a partir de esforços de governos estaduais ou municipais, sem uma visão de desenvolvimento sustentável para toda a área da bacia hidrográfica. O tema da revitalização de bacias hidrográficas foi implantado e amplamente discutido a partir de 2007 com foco na bacia do São Francisco, e em 2018 teve início a elaboração do Programa de Revitalização de Bacias Hidrográficas (PNRBH).

Nesse contexto, foi lançado em dezembro de 2020 o Programa Águas Brasileiras com o objetivo de alavancar iniciativas de recuperação de áreas degradadas com o uso de tecnologias avançadas, consolidar e recuperar APPs, avançar nos mecanismos de conversão de multas ambientais e PSA e, aprimorar medidas de gestão e governança que garantam segurança hídrica em todo o País. Foram escolhidas como prioritárias as UGRHs Tocantins-Araguaia, Parnaíba, São Francisco e Paraguai (com foco na bacia do Taquari), e selecionados por meio de edital 26 projetos de revitalização que contemplam mais de 250 municípios de 10 UFs nessas quatro áreas.