Estações de monitoramento de parâmetros da água são dispostas no território nacional de maneira estratégica, formando as redes de monitoramento, para medir a quantidade e a qualidade da água disponível para os diversos usos. A disponibilidade é resultado das características da bacia hidrográfica e pode ser afetada pela presença de infraestrutura hídrica, poluição e eventos críticos relacionados ao clima.
Monitoramento Hidrológico
O monitoramento hidrológico é realizado para fornecer informações, ao longo do tempo, sobre a quantidade e a qualidade dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos em todo o território nacional. Grande parte do monitoramento ocorre em estações pluviométricas e fluviométricas, que monitoram as chuvas e os rios. Há também monitoramento por satélite, monitoramento da qualidade da água, das águas subterrâneas e dos reservatórios.
Rede Hidrometeorológica Nacional
A Rede Hidrometeorológica Nacional (RHN) possuía, em 2020, quase 23 mil estações sob responsabilidade de várias entidades. A ANA gerencia diretamente 4.841 estações, sendo: 2.717 pluviométricas (monitoram as chuvas) e 2.024 estações fluviométricas (monitoram os rios). Do universo de estações fluviométricas, em 1.485 estações há medição de vazão de água (descarga líquida), em 1.542 de qualidade da água e em 463 de sedimentos em suspensão (descarga sólida).
Há também um monitoramento hidrológico específico e obrigatório para o setor de geração de energia elétrica na RHN. Atualmente, o monitoramento é realizado por 692 empresas concessionárias ou autorizadas para exploração do potencial hidráulico e que são titulares de 955 empreendimentos, sendo: 94 usinas do tipo Central Geradora Hidrelétrica (CGH), 674 do tipo Pequena Central Hidrelétrica (PCH) e 187 do tipo Usina Hidrelétrica (UHE).
Estações Automáticas
Com os avanços tecnológicos das últimas décadas, o monitoramento hidrometeorológico foi modernizado, passando dos registros em fichas de campo em papel dos dados de pluviômetros e réguas por observadores ao uso de diversos sensores automáticos ligados a uma plataforma de coleta de dados (PCD), com o armazenamento dos dados in loco por registradores e transmissão por telefonia móvel ou satélite. No Brasil, fatores como a extensão territorial, a dificuldade de acesso às estações (na Amazônia e Pantanal, por exemplo) e a necessidade de informações em intervalos curtos de tempo para a prevenção de eventos críticos, como inundações, justificam o uso da telemetria no monitoramento, isto é, a obtenção de dados a distância e em tempo real.
Em 2020 havia aproximadamente 3.088 estações automáticas em operação de responsabilidade da ANA e de outros órgãos parceiros (órgãos estaduais, empresas privadas do setor elétrico, dentre outros).
O acesso aos dados e informações do monitoramento ocorre pelo portal do Sistema de Informações Hidrológicas (HidroWeb) e pelo sistema Hidro-Telemetria, vinculados ao Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH). Além do monitoramento convencional, reservatórios e rios de médio e grande porte são monitorados a partir de dados obtidos por satélite. Dados de radares altimétricos são usados para determinar o nível da água, enquanto dados de sensores óticos servem para estimar parâmetros de qualidade da água. Em 2020, havia 72 “estações virtuais” de monitoramento da qualidade da água e 173 de monitoramento de nível. Esses dados são disponibilizados no portal do monitoramento hidrológico por satélite (HidroSat).
Águas Superficiais
A chuva é a grande fonte de água para o continente. Sua quantidade e dinâmica de ocorrência durante o ano são variáveis no território. Embora a chuva média anual do Brasil seja de 1.760 mm, pode-se observar no ano menos de 500 mm de chuva na região Semiárida e mais de 3.000 mm na região Amazônica. Grandes variações da chuva ocorrem inclusive dentro das bacias, como se verifica explicitamente na UGRH São Francisco.
As variações de regimes fluviométricos, tanto espaciais como temporais, observadas nas bacias hidrográficas brasileiras, se devem à combinação das variadas condições de chuva, armazenamento no solo, demandas evaporativas e graus de declividade dos terrenos. Todavia, o fator predominante é a chuva, de forma que as maiores amplitudes se dão nos períodos úmidos e as menores nos períodos mais secos ou de estiagem.
Assim, dos 255 mil m³/s de água que escoam em média pelo território brasileiro, quase 80% encontra-se na bacia Amazônica. Além disso, a vazão de estiagem Q95 corresponde a aproximadamente 30% da vazão média, sendo 63 mil m³/s na bacia Amazônica e 13,5 mil m³/s no restante do País, mas com variações significativas entre as bacias.
Enquanto a Q95 em rios da bacia do Paraná pode ultrapassar 40% da vazão média, em bacias do Semiárido a maioria dos rios seca no período de estiagem, de forma que a ampliação da garantia de oferta de água só pode ser alcançada a partir de reservatórios artificiais ou por transferências de outras bacias.
A Q95 é obtida pela ordenação das vazões diárias medidas na estação fluviométrica durante todo seu histórico, sendo seu valor o que limita as 5% menores observações. Assim, espera-se que em 95% do tempo a vazão no rio seja maior ou igual à Q95. Essas vazões são estimadas para os trechos de rio através de modelos de regionalização de vazões, a partir de dados das estações.
Tendo em vista as flutuações naturais dos regimes de vazão, a gestão de recursos hídricos traz o conceito de disponibilidade hídrica superficial, que é uma vazão estabelecida como referência para orientar suas ações. Seu valor é definido de forma que haja um nível alto de garantia da oferta de água para os diversos usos. Nesse sentido, são consideradas as garantias naturais e aquelas acrescentadas pela existência de reservatórios artificiais, de acordo com suas regras de operação.
De forma mais abrangente, a nível das unidades de gestão, a disponibilidade hídrica é dada pela vazão Q95 somada ao aumento de garantias ofertado pelos reservatórios, sendo que para os reservatórios que operam para otimizar a geração de energia elétrica, considera-se que esse aumento se refere às vazões defluentes mínimas obrigatórias, e para os demais reservatórios o aumento é dado por aquilo que sua vazão regularizada com 95% de garantia supera sua Q95.
Conforme o critério adotado para a gestão dos rios de domínio da União, a disponibilidade hídrica aqui apresentada é baseada nas vazões com 95% de garantia. A base de dados contempla estimativas a nível de trecho de rio, onde são incorporadas as interferências de 640 reservatórios, que possuem informação de sua vazão regularizada e tipo de operação. A interferência de outras infraestruturas como adutoras e canais não é considerada, a não ser transferências entre sistemas de reservatórios como as do sistema Cantareira (SP), do complexo Lages-Light (RJ), do sistema Pacoti-Riachão (CE) etc. A transposição de águas do Programa de Integração do São Francisco (PISF) ainda não é contemplada.
É importante destacar que nem toda água que compõe a disponibilidade hídrica é ofertada para ser consumida. Tendo em vista garantir o uso múltiplo das águas, no processo de gestão são previstos limitadores percentuais e absolutos do consumo ou retirada dessas quantidades de referência para viabilizar usos não consuntivos como geração de energia, recreação, manutenção de comunidades aquáticas, entre outros.
Reservação de Água
É comum ocorrerem variações de precipitação ano a ano, que costumam ser maiores em regiões como o Semiárido do que na região Sudeste do Brasil, por exemplo. Para amenizar os impactos da flutuação das vazões ao longo do tempo, são construídas obras de infraestrutura hídrica, com destaque para os reservatórios artificiais. Visando garantir a segurança hídrica nas bacias hidrográficas, eles potencializam a disponibilidade de água superficial, armazenando água nos períodos úmidos e ofertando-a ao longo do tempo, sobretudo nos períodos de estiagem.
O Brasil possui um quantitativo de 240.899 massas d’água, ocupando uma área superficial total de 173.749,56 km². As massas d’água classificadas como artificiais, ou seja, de origem antrópica, somam 174.527 ou 72,4% do total, e ocupam uma área de 45.583,76 km², sendo que a maioria, 92%, possui área superficial menor ou igual a 10 hectares.
Cerca de 3.661 reservatórios possuem informação de capacidade total de armazenamento registrada na base de dados, que totaliza 630,2 bilhões de m³ no País, 92,7% deste total representado pelos reservatórios para geração de energia hidrelétrica. A maior capacidade de armazenamento de água encontra-se em UGRHs da bacia do Paraná (Paraná, Iguaçu, Paranapanema, Grande e Paranaíba), Tocantins-Araguaia e São Francisco. Essas UGRHs totalizam mais de 266 bilhões de m³. Em 2020 eram monitorados pela ANA um total de 713 reservatórios, por meio do Sistema de Acompanhamento de Reservatórios (SAR) com o apoio de diversas instituições parceiras.
Comportamento recente de chuvas e vazões
Na última década, observou-se uma redução significativa das vazões observadas em grande parte do Brasil, especialmente no período entre os anos de 2014 e 2017, e no ano de 2020. A região Nordeste, que depende fortemente da água armazenada em seus reservatórios, apresentou uma grande seca, que se estendeu de 2012 até 2016. Como reflexo da seca de 4 anos consecutivos, 65 dos açudes que fornecem água para abastecimento público encontravam-se secos em dezembro de 2016. Na UGRH São Francisco, observaram-se reduções das vazões na ordem de 25 a 50% no período entre 2010 e 2020. Reduções importantes nas vazões também foram registradas na UGRH Tocantins-Araguaia e na maior parte da UGRH Paraguai.
Além das estiagens, também ocorreram cheias pontuais em algumas UGRHs na última década. Nas UGRHs da bacia Amazônica foi observado aumento das vazões, contudo em algumas estações de monitoramento em Roraima (UGRH Negro) e no Acre (porção Sul das UGRHs Juruá e Purus) houve indicativo de redução. Situação semelhante foi observada na região Sul do País. Na bacia do Paraná, parte das UGRHs apresentaram redução significativa da vazão média (UGRHs Paranaíba, Grande e PCJ), e outra parte um aumento substancial das vazões (UGRHs Paraná, Iguaçu e Paranapanema). Na UGRH Uruguai, parte das estações apresentaram aumento, e outra parte diminuição das vazões.
Impactos nos Reservatórios
Os volumes de chuva nos períodos úmidos de 2015 a 2017 foram abaixo da média, resultando em reduzidas recargas dos reservatórios do Sistema Interligado Nacional (SIN), que compreende os principais reservatórios de geração de energia. Consequentemente, esses reservatórios foram deplecionados, encontrando-se em níveis extremamente baixos ao final de 2017. Ao longo de 2018 houve recuperação de parte dos seus volumes, que, no entanto, voltaram a atingir níveis bastante reduzidos ao final de 2019, apresentando o menor volume útil nessa época para os últimos 5 anos. Ao final de 2020, o volume útil do SIN era praticamente igual ao de 2019, de cerca de 30%. Em junho de 2021, era de 54,1%, o menor valor observado para essa data desde 2015.
No Nordeste, região que depende grandemente da água armazenada em reservatórios, houve recuperação de parte dos volumes ao longo do período 2017-2021. No início de 2021 o volume armazenado pelo reservatório equivalente do Nordeste era de 36,2%, valor 16,6% maior que o observado no início de 2020.
O volume útil do SIN corresponde ao somatório dos volumes dos reservatórios, desconsiderando o volume de água abaixo do nível mínimo operacional, também chamado de volume morto. O Reservatório Equivalente do Nordeste contabiliza os volumes armazenados nos reservatórios com capacidade acima de 10 milhões de m³ nos estados da Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte.
Monitoramento das Águas Subterrâneas
No Brasil, o monitoramento de águas subterrâneas é bastante incipiente, quando comparado ao das águas superficiais. A nível nacional, a partir de 2009, foi implantada pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) a Rede Integrada de Monitoramento das Águas Subterrâneas (RIMAS), com o objetivo de acompanhar as variações espaciais e temporais quali-quantitativas das águas nos principais aquíferos brasileiros.
Em 2020, a RIMAS contava com 409 pontos de monitoramento, distribuídos em 24 aquíferos em 20 UFs. O número de pontos de monitoramento teve um crescimento bastante expressivo de 2008 a 2015, e os sistemas aquíferos com maior quantidade de pontos são o Urucuia (79), Bauru-Caiuá (61), Amazonas (58) e Guarani (44).
Águas Subterrâneas
A disponibilidade de água superficial, apesar da relevante influência da regularização do fluxo de água dos rios pelos reservatórios, é garantida pela contribuição de água dos aquíferos, que representam o fluxo de base da maior parte dos rios em território nacional. As extrações de águas subterrâneas podem reduzir esse fluxo e impactar as vazões dos rios. Por isso, para definir a disponibilidade hídrica subterrânea, é importante utilizar apenas uma parcela das reservas renováveis dos aquíferos (uma parcela da recarga) de modo que o restante seja destinado à manutenção das vazões dos rios.
Estima-se que a disponibilidade de água subterrânea no Brasil seja em torno de 13.205 m³/s e, da mesma forma como ocorre com as águas superficiais, sua distribuição pelo território nacional não é uniforme e as características hidrogeológicas e de produtividade dos aquíferos são variáveis, ocorrendo regiões de escassez e outras com relativa abundância.
Para estimar o quanto da disponibilidade hídrica subterrânea já está sendo consumida, é preciso conhecer os volumes extraídos pelos poços. Em 2017 estimou-se a existência de 1,2 milhões de poços no Brasil, estimativa ampliada para 2,6 milhões de poços em 2021.
Qualidade das Águas
A qualidade das águas subterrâneas é influenciada pela dinâmica de interação com as rochas dos aquíferos, pelo tempo de circulação no subsolo, bem como por variáveis relacionadas às atividades antrópicas, provenientes de fontes pontuais e fontes difusas de contaminação.
Assim como ocorre com as águas subterrâneas, a qualidade das águas superficiais de rios, córregos, lagos e reservatórios é um fator que determina sua disponibilidade para diversos usos, tais como o abastecimento humano, recreação, produção de alimentos e a indústria. A qualidade da água superficial e subterrânea é condicionada por variáveis naturais ligadas, por exemplo, ao regime de chuvas, escoamento superficial, geologia e cobertura vegetal, e por impactos antrópicos, como o lançamento de efluentes, o manejo dos solos, cargas contaminantes manipuladas, despejadas ou dispostas em superfície ou sub-superfície, entre outros.
Monitoramento da Qualidade das Águas Superficiais
O monitoramento da qualidade de água possibilita a verificação de tendências e a identificação de áreas prioritárias para o controle da poluição hídrica, bem como sua adequação para os diferentes usos. Além disso, é fundamental para a elaboração de planos de recursos hídricos e o enquadramento dos corpos hídricos em classes de uso, pois fornecem subsídios a um diagnóstico completo dos corpos d’água de uma bacia hidrográfica.
A RHN e a Rede Nacional de Monitoramento da Qualidade de Água (RNQA) são as principais fontes de dados de monitoramento da qualidade da água no Brasil. Embora a RHN tenha como foco principal o monitoramento quantitativo, ela também monitora parâmetros básicos de qualidade, como pH, temperatura, oxigênio dissolvido (OD), turbidez e condutividade elétrica, por meio de sondas multiparamétricas, em todas as UFs.
A RNQA, por sua vez, monitora também parâmetros adicionais que demandam coleta e análises laboratoriais, e é operacionalizada pelo Programa Qualiágua, coordenado pela ANA e executado pelas UFs. Nos últimos anos, o quantitativo de pontos de monitoramento da RNQA praticamente dobrou, passando de 1.486 em 2016 para 2.938 pontos em 2020. Metas progressivas foram estabelecidas em comum acordo com as instituições executoras nas UFs, em função de suas capacidades, sendo que em alguns casos ainda não foi iniciado o monitoramento. Além disso, cumpre citar que em 2020 houve descontinuidade no monitoramento de alguns pontos da RHN e RNQA, em virtude da pandemia de Covid-19 e a consequente necessidade de isolamento social.
Indicadores de Qualidade de Água
A qualidade da água pode ser avaliada por meio das substâncias e organismos nela presentes, assim como de suas características físicas, tais como transparência e odor, por exemplo. Estes indicadores são conhecidos como parâmetros de qualidade de água e são muito úteis para determinar a adequação da água aos mais diversos usos.
A Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) representa a quantidade de oxigênio dissolvido na água que foi consumido por bactérias e outros microrganismos nos processos biológicos de degradação da matéria orgânica no meio aquático. Assim, valores mais elevados de DBO indicam a poluição da água pela matéria orgânica, que é abundante em efluentes domésticos e industriais de determinadas tipologias, principalmente de indústrias de alimentos e bebidas.
O monitoramento da DBO no Brasil aponta problemas relacionados à poluição por cargas orgânicas nos grandes aglomerados urbanos nos anos de 2019 e 2020. Nestes grandes centros, os rios que atravessam as áreas altamente urbanizadas recebem elevadas cargas orgânicas provenientes de efluentes não tratados e da poluição difusa das cidades. A redução destas cargas representa um grande desafio para a implementação do saneamento básico no País.
O aumento do fósforo nos rios e, principalmente, em ambientes lênticos, como lagoas e reservatórios, pode desencadear o crescimento excessivo de algas e plantas aquáticas com consequente redução do oxigênio dissolvido na água (eutrofização) e com potencial para produzir toxinas perigosas para a saúde humana e animal. O fósforo encontrado nos corpos d’água tem como principais fontes os solos da bacia hidrográfica, os fertilizantes utilizados na agricultura, dejetos de criações animais e efluentes domésticos ou industriais. A erosão dos solos, sobretudo nas margens de rios, lagos e reservatórios intensifica o aporte de fósforo para estes corpos hídricos. Portanto, o manejo adequado do solo é importante para evitar o enriquecimento excessivo das águas por fósforo.
Na região Semiárida, a oferta de água é assegurada pelos numerosos reservatórios da região. A exemplo dos anos anteriores, as concentrações de fósforo total nos açudes nordestinos continuaram altas em 2019 e 2020, o que representa riscos de eutrofização das águas destes mananciais. Nos rios e córregos brasileiros, altas concentrações de fósforo concentram-se nas grandes cidades e se estendem para o interior, principalmente nas bacias com problemas de erosão e assoreamento e onde há intensa atividade agrícola.